terça-feira, setembro 04, 2018

O novo nome do velho fascismo.


Charles-Pierre Baudelaire, um poeta francês disse um dia que: “a maior astúcia do demónio
é fazer crer ele que não existe”. Esta afirmação de Baudelaire é algo que pode ser dito não só no sentido teológico, mas também nas sociedades humanas. Isto porque um dos grandes trunfos daqueles que pretendem dominar os outros é usar máscaras para fazerem crer que não são os mesmos que no passado tanto mal fizeram à humanidade.  
Na década de 20 e na década de 30 a Europa ainda a recuperar da Primeira Guerra Mundial decidiu fazer algumas experiências políticas, novos caminhos e em especial caminhos em que se propunham terminar com os políticos corruptos, com aqueles que apenas pretendiam enganar o povo, aqueles que controlavam tudo para se manter no poder. Diziam que a democracia era um engano porque os eleitos eram sempre bandidos inactivos sem experiência e sem conhecimento da realidade do homem comum, o que de facto não era muito longe da verdade. Apresentavam-se sempre como os representantes do cidadão comum, o cidadão trabalhador, como alguém que mais do que representante era como eles, tinha sofrido as mesmas agruras e agora revoltava-se contra esses bandidos responsáveis pelo estado das coisas, proclamando que era hora de se libertarem desses políticos profissionais “encantando” milhares como incautos marinheiros que se encantavam com o canto das sereias. Uma das grandes vantagens que esses novos arautos da revolta contavam era com a grande quantidade de analfabetos e ignorantes que grassavam na Europa por essa altura.
Assim na década de 20 e década de 30 a Europa viu subir ao poder vários destes “filhos da providência”, começou com Mussolini e o fascismo na Itália em 1922, depois a ditadura militar portuguesa em 1926, de inspiração fascista e que foi a rampa de lançamento de Salazar que entrando em cena em 1928 chegou ao poder, de facto, definitivamente em 1933, no mesmo ano Hitler consegue formar governo na Alemanha e em 1936 Franco levou a Espanha para guerra civil e chega definitivamente ao poder em 1939 com a vitória na guerra civil. Todos estes homens se apresentaram como salvadores da pátria, do povo, para corrigir tudo e todos tiveram maneiras diferentes de fazer as coisas e entre eles havia apenas algo comum, eram ditadores. Procuravam controlar tudo e todos e aqueles que se mostrassem contrários às ideias e ideais destes homens iriam provar a brutalidade que em último caso podia significar a morte. Controlavam a imprensa, o teatro, o cinema, a literatura, a música e procuravam doutrinar as mentes para tentar controlar também o pensamento. Tinham policias com a missão de capturar e controlar os “inconformados”, policia essa que tinha informadores, tornando a sociedade numa sociedade de medo, em que as palavras tinham que ser bem medidas sob pena de ter “visitas nocturnas” para ser levado para parte incerta. Tinham campos e cadeias para estes inconformados, onde a tortura era a regra e a brutalidade a norma. Fomentavam a lógica do nós contra os outros, a existência de “raça” e a nossa era sempre superior ao outros, levando à xenofobia e subjugação ou extermínio do racialmente inferior. Usavam a tradição como modelo de liderança, criando superiores e inferiores até dentro de casa, o pai manda, os filhos e a mulher obedecem, assim como o ditador manda e todos obedecem, ou seja, a misoginia era tida como algo natural e tradicionalmente aceite.
Começaram na mesma altura e terminaram em alturas diferentes e de formas diferentes, Hitler e Mussolini (por arrasto) levaram o mundo para a segunda guerra mundial, onde pereceram cerca de 60 milhões de pessoas, e após a derrota Mussolini foi morto e Hitler suicidou-se. Portugal e Espanha apenas eram países neutrais embora com “neutralidade colaborante” e por isso mantiveram-se no poder após a guerra, Salazar governou até ficar incapacitado em 1968 e Franco governou até à sua morte em 1975. Em ambos os casos os seus regimes acabaram por sobreviver pouco relativamente aos seus criadores.
Portugal, Espanha, Itália e Alemanha democratizaram-se, formaram democracias plenas e viveram como toda a Europa numa grande vantagem, pois as pessoas recordavam a guerra que de uma forma ou de outra todos eles líderes tiveram, viram o sofrimento da falta da liberdade, sabiam o que líderes “providencialistas” significavam e tinham o conhecimento e a experiência para saber que não se devia dar confiança a determinadas conversas e teorias que não passam de demagogia. Criaram-se instituições com a vontade de unir os povos da Europa para que todos pudessem desfrutar da paz e da prosperidade que todos juntos podiam alcançar, nasce a CEE.
Mas a única constante do universo é a mudança e assim o mundo mudou e também as mentalidades do final do século XX e século XXI mudaram. Em primeiro lugar os políticos mudaram e a lógica política mudou, nenhum viveu no tempo da guerra, nenhum sabe o que foi viver naqueles tempos difíceis, nasceram, cresceram e sempre viveram na fartura, praticam a soberba e vão tentando sempre tirar e tirar a quem trabalha, sem sequer compreender o que sente o povo e o perigo do descontentamento generalizado. Estes políticos também têm desinvestindo na escola, podem gastar milhões, mas sempre com uma orientação de interesse político, a economia e os números interessam e é aí que se deve investir na educação, ao contrário as humanidades que ensinam a História e a Filosofia ensina as pessoas a pensar e povo que pensa é povo que vê, percebe e protesta e povo que protesta não contribui para a economia e se não contribui não interessa. Depois temos o outro ponto nefasto desta equação que é a informação, ela é normalmente importante, mas hoje é tanta e de tantas formas e tão permanente que se torna perniciosa. Basta abrir uma qualquer rede social para descobrir uma centena de notícias em estão misturadas notícias falsas com notícias verdadeiras e para piorar tudo muitas vezes a distinção é difícil e não poucas vezes os meios fidedignos caem no erro de passar informações falsas.
Voltemos ao diabo e à parte de convencer os homens de que não existe, existem uns quantos que se têm aproveitado desta nova sociedade de políticos de vistas curtas, de notícias descontroladas e de um desinvestimento no conhecimento das humanidades. Estes novos políticos aparecem como “novas ondas” têm uma maneira nova de fazer política e têm ideias “novas”. Apelidam-se todos de “populistas”, apresentam-se contra o estabelecido, dizem que querem implantar uma nova política de verdade e acabar com os políticos que mentem e enganam. Acham-se superiores aos outros, vão usando a conversa do nós contra os outros, até porque dizem que todos estão contra eles, em especial os meios de informação, a vitimização funciona. Apresentam-se como providencialistas e são ouvidos e usam toda a demagogia possível e imaginária. E sempre que ouço estas “novas ideias”, “novos caminhos” e “novas ondas” soa sempre a velho, bafiento vindo de outra era, porque é isso mesmo de que se trata, estamos perante os mesmos que no passado semearam a ditadura e a guerra a tentar uma nova vaga. Alguns já lá chegaram, Trump, Giuseppe Conte que não é mais que a cara de um governo liderado pelo líder da extrema direita Matteo Salvini, Viktor Orbán entre outros, como a Le Penn tem a presidência da França não como uma miragem, mas como algo muito possível.
Concluo dizendo que assim temos a tríade para a “tempestade perfeita”, temos políticos estúpidos e “fuinhas” que apenas pensam na economia e no favor ao amigo, esquecendo o povo, pensando que as pessoas comem números e não pensam no descontentamento, parecendo que vivem numa torre de marfim sem capacidade olhar para baixo e ver que caminham para o abismo, um desinvestimento na educação das humanidades secundarizando todo o que se relaciona com fomentar a capacidade de pensar e perceber o mundo à sua volta o que leva a uma falta de capacidade de seleccionar as quantidades brutais de informação com que somos bombardeados todos os dias e populistas que não passam de fascistas sedentos de poder e que percebem que o momento é perfeito para voltar a impor a censura, a prisão por se dizer o que não se pode, a perseguição politica e consequentemente no medo, e na subserviência. 

António Manuel Guimarães