Sarah Palin
Nos EUA os discursos políticos tendem a ser mais agressivos do que na europa. Chegam ao ponto do ataque pessoal sem que os eleitores o percepcionem como algo mais do que "fair game".
O discurso na Republican National Convention de ontem, da candidata a vice-presidente pelo GOP (Republicanos), Sarah Palin, teve uma segunda metade que certamente se consubstancia como o discurso político norte-americano mais agressivo que tenho na minha memória recente.
É normal os candidatos a vice-presidente serem justamente "armas de ataque", tradicionalmente é assim.
Palin parece, à primeira vista, uma escolha sólida para o ticket republicano: mulher e conservadora. Se McCain é um centrista, Palin é certamente de direita.
E agora uma opinião minha, nada objectiva. Foi uma péssima escolha:
1 - Toda a estratégia republicana para estas eleições passa por um ponto fulcral: Barack Obama é inexperiente para ser presidente da nação. Mas quem é Sarah Palin? É uma mulher que foi mayor de uma cidade chamada Wasilla (7 mil habitantes) e que é governadora do Alasca há 2 anos. Isto é currículo político?
Poderá ser argumentado: mas Obama é candidato a presidente, Palin "apenas" a vice-presidente. Verdade. Mas o vice-presidente, constitucionalmente, substitui o presidente em caso de necessidade. Para além disso, o vice-presidente é presidente do Senado.
Se considerarmos que John McCain tem 72 anos (se for eleito presidente será o presidente estreante mais velho da história dos EUA) e que teve graves problemas de saúde recentemente, então temos que a probabilidade de Sarah Palin poder vir a ser presidente dos EUA é maior do que em condições mais típicas. Com o exuberante currículo político que ela apresenta?
2 - Ela é especialista em energia, um ponto no qual o Partido Democrata costuma ser visto como mais forte. O problema é que ela não demonstra currículo em outras áreas, como sejam saúde, educação, economia, justiça, etc. Ela vai ter um debate contra Joe Biden, o candidato democrata à vice-presidência. Biden é um congressista sénior, tendo feito parte dos comités judicial e de relações externas do Senado. Parece-me que vai haver muito republicano nervoso durante esse debate (por pouco importante que o mesmo possa ser).
3 - Sarah Palin é conservadora. Fervorosamente anti-aborto, defensora dos valores tradicionais da família, membro activo do NRA (National Rifle Association; sim, mais uma maluquinha das armas), defensora da pena de morte, entre outras situações.
No entanto tem uma filha de 17 anos, solteira e grávida. Lá se vão os valores familiares conservadores que os neo-conservadores tanto gostam de defender. Ela tem uma visão para as famílias dos EUA que não corresponde ao que tem em casa.
E ressalvo que não tenho nada contra o facto da rapariga estar grávida, somente acho incongruente e inconsistente a posição da mãe.
4 - Sarah Palin está a ser investigada por corrupção activa, enquanto governadora do Alasca. Já o estava antes da nomeação do GOP. Pode, obviamente, estar inocente; mas porquê escolher uma pessoa que tem essa suspeição a pairar?
5 - A agressividade dela, ontem, chegou a roçar o ridículo. Não votem em Obama porque a Casa Branca não é o mesmo que fazer trabalho cívico em bairros pobres. Votem em McCain porque é um herói que esteve preso, vários anos, no Vietname. Estou, obviamente, a simplificar o discurso dela, mas isto faz algum sentido?
6 - Em Setembro de 2008 a candidata a vice-presidente dos EUA é defensora da guerra no Iraque e da manutenção das tropas norte-americanas no país.
7 - É muito comum que o candidato a vice-presidente complemente o candidato a presidente. Quando o presidente é do norte, muitas vezes o vice-presidente é do sul, e vice-versa. Ou então escolher um vice-presidente de um "swing state", um estado importante e no qual a votação entre azul e vermelho se prevê renhida.
Alasca? Vale 3 votos no colégio eleitoral (é um dos estados que vale menos votos, até porque 3 é o mínimo). Para além disso não é propriamente um estado no qual a votação se preveja renhida: desde 1968 que o Partido Republicano tem ganho sempre no Alasca, em eleições presidenciais.
João Pedro